Qual seria a solução para amenizar o número de homicídios no Brasil?

Não é (in)comum ouvirmos em nosso dia a dia que o pobre é um criminoso em potencial. Tal discurso é tão divorciado da realidade quanto a afirmação de que o cárcere não foi “feito” para o rico, isto é, não há aplicabilidade do direito penal às camadas mais nobres da sociedade.

Se o primeiro raciocínio tivesse guarida, não teríamos explicações no que concerne ao sucesso de inúmeros brasileiros que o passado humilde não foi entrave para o sucesso futuro e, sobretudo, os que mesmo na simplicidade (vivendo com pouco) são honestos e distantes de quaisquer práticas contrárias à Lei.

Fato é que não se tem um argumento certo. O cárcere foi pensando como ferramenta repressora para crimes graves, não havendo um modelo ideal de criminoso, sendo ele rico ou pobre, todos nós estamos sujeitos à aplicação da Lei Penal.

Além disso, o argumento de que o cárcere não abriga os mais poderosos, tratou de cair por terra com o anúncio das últimas operações propagadas pelo País, com o ponta pé inicial da ação penal 470 (batizada como mensalão).

Inegavelmente, o Brasil vive um período de instabilidade econômica, sendo esta responsável por grande parte da (des)confiança do mercado exterior nas políticas internas, tal dado econômico é acirrante ao descontrole social. É assim no mundo todo. No livro “O Príncipe” de Maquiavel, o autor nos ensina que: “Nunca se deve deixar prosseguir uma crise para escapar a uma guerra, mesmo porque dela não se foge, mas apenas se adia para desvantagem própria”.

A falta de credibilidade no mercado possui como um dos corolários a falta de investimento, dinheiro, emprego, aumento do mercado informal, bem como o mais óbvio dos efeitos, o desmantelamento do Estado – restando nas mãos de poucos a riqueza, refletindo na falta de justiça social levando a um perigo anunciado denominado como: abandono dos menos (des)favorecidos.

Crimes como o de homicídio certamente são um dos reflexos desta instabilidade econômica, não sendo este o único ingrediente capaz de assumir sozinho tamanha responsabilidade À instabilidade econômica são somadas a corrupção, ausência de políticas sociais e um sistema de educação, saúde e segurança ineficientes, configurando, assim, o atual cenário de elevadíssima taxa de homicídios por ano.

Tais elementos se revelam por meio de números.

Os dados oficiais do Instituto de Segurança Pública (ISP) divulgados em setembro demonstram o crescimento dos números de violência do Estado do Rio de Janeiro, este que foi responsável por sediar um dos maiores eventos esportivos do mundo. Tais dados comprovam que o crescimento aumentou de forma preocupante.

Roubo de Veículos – 2016, em agosto, foram 1269 / 2015, em agosto, foram 1099 / crescimento de 15,5%

Roubos a Transeuntes – 2016, foram 3.670 / 2015, foram 2.646 / crescimento 38,7%.

Homicídios Dolosos – Em agosto de 2016, foram 100. Em 2015, no mesmo mês, foram 86. Um crescimento de 16,2%.

Total de Roubos – 2016, foram 8.155 / 2015, foram 6.100 / crescimento 33,6%.

Total de Furtos – 2016, foram 10.079 / 2015, foram 7.536 /crescimento 33,7%.

Roubos em Ônibus – 2016, foram 1204 / 2015, foram 628 /crescimento de 91,7%.

Roubos de Celulares – 2016, foram 895 / 2015, foram 631 /crescimento 41,8%.

Outro aspecto que nos chama a atenção é a guerra, sem sentido, contra o tráfico de drogas.

Neste último, seleciono os ensinamentos da Professora Maria Lúcia Karam, que em três passagens decisivas aduz: “não são as drogas que causam a violência; o que causa a violência é a proibição”; “não há pessoas fortemente armadas, trocando tiros na rua, junto às fábricas de cerveja ou junto aos postos de venda dessa e de outras bebidas alcóolicas. Mas isto já aconteceu.

Foi nos EUA, entre 1920 a 1933”. E conclui: “tratamentos compulsórios vinculados ao sistema penal não passam de pena mal disfarçadas”. Tais passagens reiteram o entendimento, também defendido pelo professor e pesquisador Manuel Eisner, de que as taxas de homicídio são elevadas sempre que há disputa pelo controle sobre mercados ilegais (com destaque para as drogas, no caso do Brasil).

É interessante mencionar que, ainda de acordo com Eisner, professor do Centro de Pesquisas em Criminologia da Universidade de Cambridge, dez vezes mais pessoas morrem de forma violenta fora das zonas de conflito que dentro delas. Tal dado é facilmente constatado ao observamos os rankings dos países mais violentos do mundo. Nota-se que o topo é ocupado predominantemente por países latino-americanos pobres, enquanto os locais que vivenciam grandes conflitos armados (como Iraque e Síria) não constam sequer entre os vinte e cinco primeiros colocados.

No Brasil, a criminalidade aumentou, pois nossa matriz de desenvolvimento está equivocada, basta verificarmos os discursos nos nossos futuros governantes sobre política criminal.

A contradição entre a política criminal e as ações eficazes se materializa, no campo das iniciativas de prevenção, sob forma de enfrentamentos cotidianos, pois neste plano de fundo existe uma contradição estrutural, insolúvel, caso mantermos os moldes das políticas públicas que vigem no Brasil.

A inabilitação da Polícia Militar, as propostas de militarização das guardas municipais e a clara legitimação da truculência contra pobres e indesejáveis, bem como o aumento das mortes de policiais militares são soluções que demonstraram, de forma matemática, que violência + violência não poderá resultar em paz, tampouco no decréscimo desses numerais estatísticos.

Visto isto, podemos considerar que o combate à corrupção, a intolerância quanto à posse de armas de fogo, o treinamento policial, políticas de moradia que evitem a concentração da pobreza e um sistema educacional competitivo e acessível são possíveis soluções para reduzir a elevada taxa de homicídios.

Empiricamente, a experiência que sintetizo brevemente se dá na conclusão de tais crimes. Atuo como advogado na posição de acusação (através da legitimidade via assistente à acusação) e como advogado de defesa. Considerando o núcleo da atividade judicante, na essência, percebo que após o oferecimento da denúncia não há nenhuma organização governamental que se preocupe com os familiares dos envolvidos nesta ótica (autor e vítima), ignorando que há perda de ambos os lados.

Artigo publicado originalmente no Administradores.